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23/06/2013

CONCURSO DE CRIMES (síntese p/ estudos)

Antes de tratarmos das formas de concurso de crimes, curial compreendermos os sistemas de aplicação de penas existentes, como segue:
SISTEMAS DO CONCURSO DE CRIMES
Sistema da acumulação material (adotado pela legislação brasileira)
Quando da concretização de mais de um resultado típico, todos esses resultados devem ser punidos, portanto, somando-se as penas de cada um deles.
Geralmente ocorre quando há concurso material de crimes (cf. veremos adiante), entretanto,  alguns tipos penais já trazem esta regra expressa, como por exemplo:
Injúria Real

Art. 140 - Injuriar alguém, ofendendo-lhe a dignidade ou o decoro:
Pena - detenção, de um a seis meses, ou multa.
... 
§ 2º - Se a injúria consiste em violência ou vias de fato, que, por sua natureza ou pelo meio empregado, se considerem aviltantes:Pena - detenção, de três meses a um ano, e multa, além da pena correspondente à violência. 
Percebam que além da sanção imposta ao delito de injúria real (sobre injúria real veremos em outro post), o dispositivo em questão prevê a soma com a pena prevista para o emprego de violência (lesão corporal). Aqui, quando o legislador menciona a hipótese de soma de pena pelo emprego de violência, trata especificamente da lesão corporal, visto que se a conduta materializar a contravenção penal denominada vias de fato (art. 21 da Lei n.3688/41 - LCP), esta será absorvida pelo delito de injúria real (princípio da consunção), como veremos em outro post específico sobre o tema.      
Em síntese, o sistema de acumulação material determina a punição de todos os resultados causados pela pluralidade de condutas, somando-se as penas cominadas a cada uma dessas condutas, sendo que alguns dispositivos penais já trazem esta regra expressa, mesmo que haja, nestes casos, apenas uma conduta (ex 2.: art. 344, CP - coação no curso do processo - reclusão de 1 a 4 anos e multa + a sanção correspondente à violência - uma ação / mais de um resultado = soma de penas). 
Sistema da exasperação da pena (adotado pela legislação brasileira)
Sistema benéfico ao acusado. Aplica-se ao concurso formal de crimes (que veremos adiante), quando há uma única conduta com dois ou mais resultados, punindo-se o mais grave e apenas uma parte das penas dos demais crimes (de 1/6 a metade).
Sistema da absorção
Havendo concurso de crimes, pune-se apenas o mais grave, que absorve os demais delitos. É o sistema adotado em Portugal. A legislação brasileira não o adotou, mas a jurisprudência o aplica quando diante de conflito de normas opta pela aplicação do princípio da consunção (crime-fim absorve o crime-meio).
Sistema da acumulação jurídica
Adotado na Espanha. Faz uma ponderação entre as penas, somando-as, porém posteriormente triplicando a mais grave. Exemplo: 5 anos + 5 anos + 3 anos + 1 ano + 2 anos = 16 anos = 15 anos, ou seja, o triplo da pena mais grave (que foi 5 anos). 
Este sistema não é adotado no Brasil.

Vamos agora às formas de concursos de crimes e suas peculiaridades: 
CONCURSO MATERIAL 
Art. 69. Quando o agente, mediante mais de uma ação ou omissão, pratica dois ou mais crimes, idênticos ou não, aplicam-se cumulativamente as penas privativas de liberdade em que haja incorrido. No caso de aplicação cumulativa de penas de reclusão e de detenção, executa-se primeiro aquela.
No concurso material o agente exerce duas ou mais condutas, produzindo dois ou mais resultados, idênticos (concurso material homogêneo) ou não (concurso material heterogêneo).
Exemplo: Duplo homicídio, contra vítimas distintas, sem continuidade delitiva (em outras palavras, não pode ter matado as duas pessoas com um único disparo, pois nesse caso teríamos um concurso formal imperfeito, sobre o qual discorreremos mais adiante).
Aplicação da pena
Primeiramente o juiz individualiza cada uma das penas, aplicando-as separadamente (com observação das qualificadoras, atenuantes/agravantes, minorantes/majorantes - critério trifásico - art. 68 do CP) depois, ele faz a soma.
IMPORTANTE: A soma das penas não pode ultrapassar o limite de 30 anos. Por isso, em caso de pena superior à aludida, o juiz atenuará, o que denomina-se concurso material moderado
Art. 75/CP - O tempo de cumprimento das penas privativas de liberdade não pode ser superior a 30 (trinta) anos.
STF Súmula nº 715/ STFA pena unificada para atender ao limite de trinta anos de cumprimento, determinado pelo art. 75 do Código Penal, não é considerada para a concessão de outros benefícios, como o livramento condicional ou regime mais favorável de execução. 

Cabimento de fiança

Cabe fiança, desde que as penas mínimas somadas não sejam superiores a 2 (dois) anos.

STJ Súmula nº 81 - 17/06/1993 - DJ 29.06.1993
Fiança - Concurso Material - Soma das PenasNão se concede fiança quando, em concurso material, a soma das penas mínimas cominadas for superior a dois anos de reclusão.

CONCURSO FORMAL

Art. 70/CP - Quando o agente, mediante uma só ação ou omissão, pratica dois ou mais crimes, idênticos ou não, aplica-se-lhe a mais grave das penas cabíveis ou, se iguais, somente uma delas, mas aumentada, em qualquer caso, de um sexto até metade (concurso formal perfeito - grifo meu). As penas aplicam-se, entretanto, cumulativamente, se a ação ou omissão é dolosa e os crimes concorrentes resultam de desígnios autônomos, consoante o disposto no artigo anterior (concurso formal imperfeito - grifo meu). 

Ocorre quando o agente, mediante uma única ação ou omissão provoca dois ou mais resultados típicos, idênticos (concurso formal homogêneo) ou não (concurso formal heterogêneo). Nesses casos, o juiz aplicará a pena mais grave (ou escolherá uma das penas mais graves se forem idênticas), acrescida de 1/6 a metade, pelo sistema da exasperação que vimos anteriormente.

Concurso formal perfeito (ideal, normal ou próprio)

Os resultados decorrem de um único desígnio (plano/propósito). 

Exemplo n.1: Agente que subtrai cinco produtos de um supermercado.

Exemplo n.2: Motorista que faz ultrapassagem de risco (c/ dolo eventual), causando acidente e matando 20 (vinte) pessoas.


Concurso formal imperfeito (anormal ou impróprio)
Resultados decorrentes de uma pluralidade de desígnios, sempre com dolo. 
Ex. (clássico exemplo de Basileu Garcia): Agente que enfileira suas vítimas e as mata com um único tiro de arma potente.
Aplicação da pena
Concurso formal perfeito: Exasperação da pena (como já vimos)
Concurso formal imperfeito: Sistema da cumulação das penas, como no concurso material, tendo em vista que o agente age com animus de provocar uma pluralidade de resultados, não sendo merecedor da exasperação das penas. 

CRIME CONTINUADO (ou continuidade delitiva)
Art. 71/CP – Quando o agente, mediante mais de uma ação ou omissão, pratica dois ou mais crimes da mesma espécie e, pelas condições de tempo, lugar, maneira de execução e outras semelhantes, devem os subseqüentes ser havidos como continuação do primeiro, aplica-se-lhe a pena de um só dos crimes, se idênticas, ou a mais grave, se diversas, aumentada, em qualquer caso, de um sexto a dois terços.
Se dá quando o agente, mediante duas ou mais ações ou omissões, causa dois ou mais resultados da mesma espécie, em condições de tempo, lugar e modo de execução que mostram que um delito é continuação do outro.
Exemplo: O agente passa em vários estabelecimentos, praticando furtos, no mesmo dia, em continuidade.
Natureza jurídica
Teorias:
1ª) Unidade real: Todos os crimes formam um só.  
2ª) Mista: A pluralidade de crimes continuados formam outro tipo de delito. 
3ª) Ficção jurídica (adotada no Brasil): Para aplicação da pena, todos os crimes configuram um só

Teorias sobre a demonstração do crime continuado:
1ª) Subjetiva: O agente tem que demonstrar que agiu com unidade de desígnios, com propósito único (Neste sentido: Zaffaroni e outros, também o STJ).
2ª) Objetiva (adotada no Brasil): Não exige a demonstração de ter agido com unidade de desígnios, mas somente a demonstração dos requisitos objetivos (ter cometido o crime em semelhantes condições de tempo, lugar e modo (Sustentam esta tese: Feuerbach, Mezger, Von Hipple, Eduardo Corrêa, Luiz Flávio Gomes, entre outros).
3ª) Objetivo-subjetiva: Exige tanto a prova da ação por unidade de desígnios, como a prova dos requisitos objetivos, que são:
a) Crimes da mesma espécie: Conforme doutrina majoritária, são os previstos no mesmo tipo penal, independentemente da forma (simples, qualificada ou privilegiada).
b) Condições semelhantes de tempo: De acordo com a jurisprudência, prazo não superior a 30 (trinta) dias entre o cometimento das várias condutas delituosas. 
c) Condições semelhantes de lugar: Os delitos devem ter sido perpetrados na mesma comarca, ou em comarcas vizinhas, pois se tiverem sido praticados em comarcas distantes, desaparecerá a continuidade delitiva.
d) Modo de execução semelhante: Diz respeito ao modus operandi. Exemplo: Vários furtos praticados por meio de escalada (que também qualifica o crime, vide art. 155, §4º, II do CP).
Contagem para a prescrição
Autônoma, veja:
Art. 119 - No caso de concurso de crimes, a extinção da punibilidade incidirá sobre a pena de cada um, isoladamente.

Espécies de crime continuado
Crime continuado genérico ou simples
Aquele está previsto no caput do art. 71 do CP, ou seja, quando os crimes em continuidade são perpetrados sem violência ou grave ameaça, independentemente de serem tentados ou consumados.
Crime continuado específico ou qualificado
Previsto no parágrafo único do artigo 71 do CP, quando os crimes dolosos em continuidade delitiva são cometidos violência ou grave ameaça contra vítimas diferentes.
 Art. 71/CP...
Parágrafo único. Nos crimes dolosos, contra vítimas diferentes, cometidos com violência ou grave ameaça à pessoa, poderá o juiz, considerando a culpabilidade, os antecedentes, a conduta social e a personalidade do agente, bem como os motivos e as circunstâncias, aumentar a pena de um só dos crimes, se idênticas, ou a mais grave, se diversas, até o triplo, observadas as regras do parágrafo único do art. 70 e do art. 75 deste Código
Aplicação da pena
De 1/6 a 2/3 nos crimes idênticos, ou a pena mais grave se crimes distintos, aumentada de 1/6 a 2/3, isto nos casos do artigo 71 (crime continuado). Nos casos do art. 71, p.ú. (crime continuado específico), aplicar-se-á na forma sobredita, com aumento de até o triplo (observando-se o p.ú. do art. 70 e o art. 75, ambos do CP).
IMPORTANTE:
Continuidade delitiva em crimes contra a vida
STF Súmula nº 605 - 17/10/1984 - DJ de 29/10/1984, p. 18113; DJ de 30/10/1984, p. 18201; DJ de 31/10/1984, p. 18285.Não se admite continuidade delitiva nos crimes contra a vida.

Distinção entre crime continuado e crime habitual
No crime continuado cada ato é punível isoladamente, isto é, cada ato caracteriza um delito acabado. Já no crime habitual, os atos isoladamente não materializam o delito, apenas uma parte do iter criminis.

Fonte: NUCCI, Guilherme de Souza. Manual de Direito Penal: parte geral: parte especial - 5ª. ed. rev., atual. e ampl. - São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2009.

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